domingo, 5 de outubro de 2008

Contra Deus, a sociedade, o mundo, e todo o resto


Foi em 91 ou 92, não tenho certeza, com uns 14 anos quando na casa de um amigo ouvi algo que influenciaria minha vida até a idade adulta. A casa dele tinha antena parabólica e ele conseguia captar sinal da MTV, um canal “só de música!” que a gente assistia entre uma partida de Master System e outra. E lá estávamos nós atirados nas almofadas da sala quando outro vídeo começava.


Um som estranho, meio fantasmagórico, um bando de cabeludos no meio de um deserto com guitarras pontiagudas, fogo e, o que me pareceu completo absurdo, um Cristo pregado na cruz usando uma máscara de gás. Um som de explosão seguido do que parecia ser uma locomotiva desgovernada e o próprio Belzebu começou a berrar coisas incompreensíveis.


-Credo! Que isso?! Perguntei, um tanto chocado.

-Sepultura, acho. Legal né?


De fato, legal pra caralho. Na época eu escutava basicamente o que meus pais escutavam, já que meus amigos não perdiam tempo com música. Coisas tipo Michael Jackson, Beatles, Jean Michel Jarre (alguém lembra?), Freddy Mercury e toda aquela safra dos anos 80. Além do que, ainda tinha certo tato no que dizia respeito à religião, Deus e assuntos metafísicos, os quais minha mãe é um tanto sensível.


Mas não deu pra segurar, pedi pro pai comprar o vinil do tal Sepultura, cuja capa já era por si só assustadora – uma montanha bizarra com olhos, bundas, stonehenge, cadáveres e um cérebro sendo assado no alto, de cuja fumaça se vislumbrava formas fantasmagóricas. Simpático.


- Isso deve ser porcaria, Júnior! Tu já ouviu essa coisa?? Perguntou um pai meio indignado, meio preocupado, em alguma loja de discos.

- É legal, pô. Não tem nada demais...


Ele cedeu sem maiores problemas, como normalmente acontece, e comprou o disco. Mas não sem algum comentário do tipo “tua mãe vai me matar”. E, bom, ele não estava totalmente errado.


Heavy Metal não tem graça escutar em volume civilizado, ou seja, baixo. Ponto. Como sentir o som do pedal duplo no peito e apreciar riffs de guitarra fodões sem o impacto de um áudio poderoso? Enfim, logo na primeira tocada do disco, lembro da mãe aparecer com um olhar meio assustado na porta do meu quarto no nosso antigo apartamento, enquanto Max Cavaleira urrava contra Deus, a sociedade, o mundo, e todo o resto.


-Júnior!! Que isso? Que gritaria é essa?

-Hã...... Sepultura?


Eu não era o guri mais rebelde do mundo. Na verdade, ficava constrangido em escutar aquele som sob o mesmo teto da mãe. Era um negócio blasfemo, anticristão, cheio de ódio e subversivo em todas as modalidades imagináveis. Era como ser pego com uma revista de mulher pelada no ato.


Adolescência. Acho que foi meu primeiro ato de adolescência, chocar o povo da casa com Heavy Metal (e ficar constrangido com isso!). O segundo foi me declarar ateu pra minha mãe. Daí a começar a usar roupas escrotas, parar de tomar banho (grunge legítimo), deixar crescer uns pentelhos na cara que em nada lembravam barba e raspar a cabeça (júnior! Que horror! Parece que fugiu de um hospício!) foi um pulinho de nada.


Em pouco tempo, as paredes do quarto estavam cobertas com pôsters, eu tentava (inutilmente) aprender a tocar guitarra e vivia plenamente as confusões criadas por um comportamento auto-destrutivo e auto-depreciativo provocadas por algum desequilíbrio químico em meu jovem organismo. Oh, adolescência!


E tudo isto porque agora a pouco, flanando pelo Youtube, tropecei por acaso naquele deserto onde jaz o Cristo crucificado e mascarado contra gás.


Obliteration Of Mankind

Under A Pale Grey Sky

We Shall Arise...

Um comentário:

Diego disse...

E SURGE O BUNKER! =D

De início eu achava Sepultura horrível. Mas depois de ouvir 'por tabela' milhares e milhares de vezes o Arise, chegou um ponto em que eu já tinha até as minhas preferidas. hehehe Aí peguei pra escutar duma vez!